16 março 2009


“Sempre imaginei o paraíso como uma biblioteca.”
Jorge Luís Borges


Não vou dizer que era uma noite sombria ou que eu vinha arrastando correntes pelas ruas de Ipanema, nem assegurar-lhes que alguém passou e me fez pensar que a vida estava boa. Não era Natal, nenhum sinal no céu, nem ano bom. Apenas encontrei, no mesmo lugar em que sempre esteve, algo que estava há muito sumido. Como se explica um reencontro com algo que não se sabia perdido até o momento em que se dá de cara? Algo que se perdeu sem ser notado, sem nunca ter tido o privilégio de um olhar de esguelha para evitar que fosse perdido. Algo que, poderíamos dizer, ficou para trás.


Enfim, estava lá, absolutamente alheia a todas as minhas insatisfações, quieta, sem ambições de ser a melhor empresa para se trabalhar ou o primeiro nome do “top of mind” brasileiro. Era o meu paraíso calado, que não sussurrava mais meu nome por achar que eu tinha me desgarrado para sempre. Em letras garrafais se apresentava a mim novamente e eu, rendida, parecia adentrar um novo mundo. Todas as estantes de livros para mim, toda ela respirando e eu lá dentro, aninhada, ouvia de novo meu sangue correr.


O tédio de mim mesma, a velha raiva batida pelos mesmos problemas, escorreram pelos pés. O medo de ter virado alguém desinteressante esvaiu, o esnobismo de achar que depois de quase todos os Borges e Márquez lidos havia pouco que poderia me agradar, foi extirpado. O cheiro do café misturado a páginas novas... Eu reencontrava meu lugar no mundo e ele era ali, sentada talvez numa cadeira de praia como os velhinhos fazem, observando o movimento. As edições de mim mesma voltavam a mim enxotando as reclamações de sempre. A edição de luxo, o primeiro exemplar, o pocket-book. Virei outra ou voltei a ser a mesma, gastei horas crescendo, sapateei entre as estantes, escolhi livros que não pude levar, achei um novo autor preferido. Reencontrei meu pequeno paraíso.


Assim, abraçada por uma mãe saudosa, abençoada pela maçã mais doce da criação, voltei para casa onde o milagre se operou. Empregada, escrevendo, saciada e completa novamente.

Um comentário:

Anônimo disse...

welcome back!

 

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