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D. Eulália era linda quando casou-se e morreu mais ou menos com o mesmo rosto. Sebastião Ariza gostou dela e de sua fala mansa e de como ela comandava a casa a fazenda. Ele pediu sua mão, o pai entregou de bom grado. Na lua-de-mel Eulália conheceu Aloísio Martaga, caixeiro viajante que trazia na mala a camisola que ela encomendara para a grande noite.
"Eu embrulhei em papel de seda e perfumei com dama da noite porque imaginei que assim deveria ser a moça que usaria esta camisola." - Eulália não gostou do enxerimento e ia batendo-lhe a porta na cara quando ele completou - "Mas vendo a senhora agora percebo que estou enganado. O mais certo que a senhora deveria fazer era não vestir nada e seu marido será o homem mais feliz desse mundo." A porta bateu.
Eulália usou a camisola na noite de núpcias e, dois dias depois, deitou-se nua sob o cajazeiro ao lado de Aloísio. E assim, ela dormia vestida com Sebastião e nua na grama do cajazeiro. Ele sumiu no terceiro mês sem deixar carta.
Vinte e três anos depois, Aloísio Martaga apareceu em seu quintal sem solenidades e disse, com o mesmo enxerimento que a conquistara antes:
"Mulher, deixe o menino fazer o que quer."
"Você sabe que eu não posso Aloísio. Que irresponsabilidade seria!"
"Eulália deixa os meninos serem felizes!"
"Seria algo contra Deus!"
"Mulher, há aquela Duna na cidade. As pessoas estão rareando, estão esquecendo das outras. A cidade está vazia. Em breve você não se lembrará de mim, nem eu de você. Nem o menino de Matilda... Deixa os dois..."
"Não."
"Ele não vai fazer se você não deixar. Essa covardia ele puxou do pai. Eulália... a Duna vai apagar tudo, engolir com areia. Não vai sobrar quem lembre!"
"Deus vai lembrar!"
"Deus mandou a Duna. Ele mesmo não quer que ninguém lembre. Não basta você esquecer de mim?"
"Não. Você não vai ganhar de novo."
"Ganhar? Eu só estou perdendo! Minha vida, minha filha, minha memória, você... Eu não vou lembrar porque não vou mais sair daqui. Mas eles podem. Deixa os dois..."
Aloísio não gostava de falar muito e encerrou o pedido ali. D. Eulália se recolheu, deitou-se ao lado do marido e sonhou que Aloísio vinha encontrá-la debaixo do cajazeiro e os dois dormiam nus na grama. Na manhã seguinte liberou Alfinim para seu casamento e a boda foi em três meses. A condição que ela impôs foi que os dois se mudassem para longe dali.
Pouco tempo depois, D. Eulália esqueceu Aloísio e a areia invadiu a fazenda cobrindo até o moinho. Aloísio morreu antes de esquecer.
Um comentário:
Que lindo! Me arrepiei!
Cara, acho que você devia escrever um livro, de onde vc tira essas histórias? Quanta poesia e quanta beleza!
Beijos
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