Via essa menina pelas ruas com passos decididos para todos exceto para ela. Andava muito quieta, virada para o lado de dentro, caminhando meio pelo avesso, dando uma boa examinada em entranhas e pensamentos. Os óculos escuros, que um amigo um dia dissera que não caíam bem no seu rosto, serviam mesmo para esconder olhos revirados que encaravam o fundo da cabeça.
Vinha ela, então, muito compenetrada e meio frágil, procurar no mundo letras para o que sentia. Passava meses nessa busca sempre triste de catar letras como quem cata feijão. Juntava-as no vento, na praia e nas sopas. Roubava de risos alheios e escolhia uma ou outra entre as várias que ficavam presas em seus dedos quando passava a mão nas lombadas dos livros. Guardava todas na mente e nasciam, perto ali do coração, frases feitas de pedacinhos de realidade.
Meses neste trabalho insistente de formiga letrada para pode dizer tudo o que tinha dentro de si. Juntou suas letras mais lindas, eloqüentes e melancólicas, as mais parecidas com o que ela era por dentro e, numa noite, disse todas. Falou com todas as letras. Uma construção inteira que, aos seus olhos, formava uma escultura quase certa do que ninguém via dentro dela.
Faltavam só alguns detalhes, algumas letras e palavras que ela esperava tirar de algumas respostas e tapar buracos na sua escultura, reforçar articulações. Ao invés, recebeu um abraço gostoso, um beijo na testa, um tapinha no ombro, um cheiro leve de esperança que se desvaneceu no primeiro suspiro. Será que ouviram? Não entenderam? O sono anuviou a vista e não se pode ver como ela estava por dentro, como ela era inteira mosaico. O sono tapou as falas ou ela se enganou achando que poderiam existir e, na verdade, não eram mais que sereias e harpias?
N-e-n-h-u-m-a l-e-t-r-a.
Ficou lá a estátua que deveria dizer tudo o que ela sentia por dentro. Capenga e inaudita.
Pôs os óculos grandes demais, perdeu-se a menina dentro de si de novo, procurando outras letras para ver se diz melhor ainda o que quis dizer dessa vez. Outros meses, no entanto, até curar as bolhas das mãos e o inchaço dos olhos vermelhos, até ter coragem de se mostrar novamente e arriscar.
Novos passos pretensiosamente decididos, cada vez mais cansados de procurar.
Vinha ela, então, muito compenetrada e meio frágil, procurar no mundo letras para o que sentia. Passava meses nessa busca sempre triste de catar letras como quem cata feijão. Juntava-as no vento, na praia e nas sopas. Roubava de risos alheios e escolhia uma ou outra entre as várias que ficavam presas em seus dedos quando passava a mão nas lombadas dos livros. Guardava todas na mente e nasciam, perto ali do coração, frases feitas de pedacinhos de realidade.
Meses neste trabalho insistente de formiga letrada para pode dizer tudo o que tinha dentro de si. Juntou suas letras mais lindas, eloqüentes e melancólicas, as mais parecidas com o que ela era por dentro e, numa noite, disse todas. Falou com todas as letras. Uma construção inteira que, aos seus olhos, formava uma escultura quase certa do que ninguém via dentro dela.
Faltavam só alguns detalhes, algumas letras e palavras que ela esperava tirar de algumas respostas e tapar buracos na sua escultura, reforçar articulações. Ao invés, recebeu um abraço gostoso, um beijo na testa, um tapinha no ombro, um cheiro leve de esperança que se desvaneceu no primeiro suspiro. Será que ouviram? Não entenderam? O sono anuviou a vista e não se pode ver como ela estava por dentro, como ela era inteira mosaico. O sono tapou as falas ou ela se enganou achando que poderiam existir e, na verdade, não eram mais que sereias e harpias?
N-e-n-h-u-m-a l-e-t-r-a.
Ficou lá a estátua que deveria dizer tudo o que ela sentia por dentro. Capenga e inaudita.
Pôs os óculos grandes demais, perdeu-se a menina dentro de si de novo, procurando outras letras para ver se diz melhor ainda o que quis dizer dessa vez. Outros meses, no entanto, até curar as bolhas das mãos e o inchaço dos olhos vermelhos, até ter coragem de se mostrar novamente e arriscar.
Novos passos pretensiosamente decididos, cada vez mais cansados de procurar.
5 comentários:
Será que me arrisco a dizer que é o texto que eu mais gostei até hoje?
Bem escrito e com boas idéias e sacadas todos são e foram, mas esse mexeu comigo. É bom vê-la escancarar esse tipo de letras. Pq é a grande dúvida que tenho de você.
Fiquei com vontade de te escrever uma carta... hehehe
beijos.
é, minhamiga, esse texto valeu pelo tempo de silêncio que levou pra ser parido. Mas não arrisco comparações...
Imagino que a menina não tenha encontrado uma letra para defini-la por ela ser um mosaico, porque um fonema seria pouco, pediria outro e mais, letras se juntando num transbordar de palavrinhas de várias cores.
a menos que fosse uma letra mágica, como uma runa, cheia de significados secretos que apenas ela saberia quais são quando a encontrasse.
quanto aos óculos escuros, às vezes são necessários. Não é porque alguém olha pra dentro que vai se virar do avesso pro mundo. nem sempre é necessário...
=)
beijos
Um espelho no qual me vi mais uma vez. Adorei!
Me pergunto: Ela está realmente disposta a curar as bolhas da mão, mesmo que para isso seja necessário um emplasto que arda, ou então remover as peles soltas e mortas mesmo que sangre, ou lavar bem com sabão? As olheiras, ela quer realmente se desfazer delas ou as cultivas?
Adorei. Principalmente porque doeu.
Beijos...
Eu conheço essa moça.
By Marcão
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