10 setembro 2008

O que há nos caixotes

Agora que não há mais nada aqui, nem cheiro, nem roupa, nem gemido seu. Quando tudo está guardado, a pedido seu, em tantas caixas quanto podem caber as lembranças e seus fragmentos deixados para trás. Todas essas coisas que não farão diferença de novo para você, mas que eu guardo ainda para te ver. Só assim, com embrulhos que nunca mais serão abertos, eu percebo o quão boba fui em não me permitir saudades. Agora você me falta, só agora é muito real. Completamos todos os passos. Finalmente eu racho por você, pela nossa vida, pelas lembranças embaladas que juntam poeira. Enquanto isso não acontecia - percebo hoje - eu não me sentia humana por inteiro. Faltava a dor de crescer em mais este aspecto, o do faltar.

Agora que nada mais seu é meu, temos nossas novas vidas e poderíamos nos desejar boa-sorte não fossem orgulhos. Eu e você viramos lembrança e juntos ganhamos outros prados. Quisera eu que você se sentisse tão triste e leve assim e, então, me entender. Só agora me deixo chorar, pela partida, pelas rachaduras, pelo caminho e você. Aceito o fato, sem infantilidades, que não vai chorar por mim e que terá uma vida tão frutífera quanto a minha.

Dentro das caixas vão ainda uns últimos pedaços de você que existiam como relíquias, mas que, por sanidade, eu me obrigo a transformá-los em restos. Existe uma urgência em nos deixarmos ir. Eu sei agora que estou nas suas caixas enquanto você sai das minhas, cheio de vida, uma última vez, quem sabe.
 

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